sábado, 28 de junho de 2014

Pablo Neruda - Vinte Poemas de amor e uma canção desesperada


Vinte Poemas de amor e uma canção desesperada

Gosto quando tu calas porque estás como ausente,
e me ouves desde longe, é minha voz não te toca.
Parece como se teus olhos houvessem voado
e parece que um beijo te fechara a boca.

Como todas as coisas estão cheias da minha alma
emerges delas, plena de minha alma que te alia.
Mariposa de sonho, pareces com minha alma,
e te semelhas à palavra melancolia.

Gosto quando tu calas e estás como distante.
E estás como queixosa, mariposa em arrulho.
E me ouves desde longe e minha voz não te alcança:
deixa-me que me cale com teu silêncio puro.

Deixa-me que te fale também com teu silêncio
claro como uma lâmpada, simples como um anel!
És como uma noite mais calada e constelada.
Teu silêncio é de estrelas, simples, longe no céu.

Gosto quanto tu calas porque estás como ausente.
Distante e dolorosa como se houvesses morrido.
Uma palavra então, um sorriso é o bastante.
E estou alegre, alegre de que não tenhas ido.

Menina morena e ágil que faz as frutas,
o que amadurece os trigais e retorce as algas,
Fez o teu corpo alegre, teus luminosos olhos
e fez a tua boca que tem o sorriso da água.

Um sol negro e ansioso que se enrola nos teus fios
de negra cabeleira, quando estiras os braços.
Tu jogas com o sol como se com um esteiro
e ele deixa nos teus olhos dois escuros remansos.

Menina morena e ágil, nada a ti me aproximas.
Tu de ti me distância, como do meio dia.
És como a delirante juventude da abelha,
a embriaguez da onda, ou toda a força da espiga.

Meu coração sombrio te procura, mesmo assim,
amo teu corpo alegre, e tua voz livre e afinada.
Mariposa morena, doce e definitiva
como o trigal e o sol, uma papoula e a água.

Pablo Neruda

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